“O ensino médio universal promoveu não apenas o crescimento dos americanos, ao difundir o conhecimento e habilidades relevantes junto às massas. Ele também deu origem a uma transformação social e cultural mais complexa, à medida que o período adolescente tornou-se central para moldar quem somos. O fato é que o ensino médio envolve, e sempre envolveu, mais do que apenas o ensino […] foi a dimensão social da experiência do ensino médio, não a educacional, que foi crucial para os adolescentes. Trancafiados juntos no ambiente da escola, os adolescentes ocuparam um espaço social separado e distinto, em grande medida imune à influência adulta.”
“Esta evolução rápida no comportamento refletia uma transformação mais profunda: o caráter das gerações em formação, seus valores, temperamento e características, foram sendo transformadas pela influência poderosa dos pares durante os anos formativos da adolescência. Desejos hedonistas eram mais abertamente expressos, atividades prazerosas mais livremente realizadas. A autodisciplina [conscientiousness] foi minimizada, as normas sociais tratadas com crescente ceticismo e desdém. A impulsividade e as emoções foram mais comumente exaltadas, um espírito aventureiro e aberto amplamente endossado.”
“Estes traços de caráter joviais serviram para nos tornar mais toleranes e generosos em muitos aspectos. A tolerância crescente a grupos marginalizados pode ser parcialmente atribuída a esta mentalidade jovial emergente”.
“Mas houve um inconveniente inegável na história também. Muitos autores mapearam o crescimento pernicioso da impulsividade, incivilidade e a arrogância egoica [me-first] em diferentes setores da vida dos Estados Unidos — social e cultural, econômico e político.”
Estas são palavras do professor de Ciência Política Paul Howe, traduzidas a partir deste artigo no Aeon. A hipótese toda é ousada, mas também interessante. Remete certas atitudes “infantilizadas” na cultura atual dos Estados Unidos (incluindo na esfera política) no fim das contas ao acesso universal ao ensino médio e à criação, ali, de uma cultura adolescente. A hipótese é curiosa, entre outras coisas, porque implica que os traços de personalidade minimizados ao longo das gerações acabam por ter seu efeito contemporâneo mais saliente em uma forma extremada de expressão justamente do perfil ideológico mais associado a eles. Além disso, convida o pensamento sobre se o fenômeno pode ser observado em outros países, especialmente no Brasil; o autor nota que os Estados Unidos foram pioneiros na universalização do ensino médio, já no final da década de 1930. Finalmente, permite uma reflexão sobre a configuração e impacto da própria escola na formação das novas gerações (ou ainda, sobre a interação entre gerações que ocorre na escola e o papel que os adultos precisam ocupar aí), tópico que já vem sendo abordado por outros estudiosos do assunto.
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