Devido à panemia, a instituição onde leciono permaneceu por praticamente dois anos inteiros ensinando apenas remotamente. Seguem algumas impressões a respeito de como o ensino a nível médio se comportou nesse período.
Antes de retornar ao ensino presencial, pensei em registrar aqui algumas notas que poderiam ser úteis para pensar sobre o ensino remoto. Não havia nada grandioso, mas algumas percepções como as seguintes:
- A qualidade do áudio (um microfone adequado) é mais importante que a qualidade do vídeo para aulas síncronas e videoaulas.
- Os alunos não costumam assistir videoaulas longas em sua integralidade. Vídeos curtos, entre 10-20 minutos, ou mesmo muito curtos, têm mais chances de serem assistidos.
- É improvável que um material de aula (vídeo, texto etc.) seja estudado a menos que haja um teste de compreensão avaliativo a respeito dele. Atividades avaliativas curtas semanais parecem mais efetivas do que avaliações concentradas menos frequentes.
- Uniformidade na forma de entrega e organização das atividades de diferentes disciplinas é essencial. Em nosso caso específico, entregamos roteiros semanais que incluíam a lista de disciplinas a serem lecionadas na semana, os horários das atividades síncronas, os materiais de aula e as atividades avaliativas com seus respectivos prazos.
- O acesso e assiduidade dos alunos em maior vulnerabilidade ou baixo aprendizado é um dos maiores desafios. Em nosso caso, muitos alunos deixaram de comparecer ou realizar as atividades.
- A cola é frequente e difícil de controlar. Sistemas com sorteio de questões, capazes de gerar atividades diferentes para cada aluno, ajudam, bem como atividades de produção que exijam um material único (produção de texto ou vídeo, por exemplo).
Após um semestre de retorno à modalidade presencial, noto (ou relembro de) alguns pontos:
- Os docentes precisam empenhar uma grande quantidade de energia em questões marginalmente relacionadas ao aprendizado em sentido estrito: motivação e cobrança de empenho, gerenciamento de inadequação comportamental, em sala e fora dela. No ensino remoto, esse tipo de problema não é visível ao docente.
- Grande parte dos alunos voltou do ensino remoto com muitas lacunas de aprendizagem e em habilidades básicas, tanto cognitivas quanto de socialização. No aspecto cognitivo, em especial, penso que uma analogia com o exercício físico é adequada: uma pessoa que, estando em uma rotina de exercícios de musculação, ficasse parada por um longo período, voltaria à atividade não mais no estágio de desenvolvimento em que parou; teria regredido.
- Alguns alunos apresentam dificuldades de interação, especialmente com pares que são diferentes em suas atitudes, valores ou opiniões. A escola presencial oferece um espaço de interação com a diferença que permite exercitar habilidades que fora dali talvez não sejam tão intensamente exercitadas.
- O uso de celulares está fora do controle dos alunos e dos próprios pais. O equipamento foi útil, apesar dos seus problemas, durante a pandemia, mas a sala de aula é um dos poucos lugares onde se tem chance de proteger um tempo para o ócio criativo, a concentração genuína e o pensamento aprofundado.
- Minha instituição de trabalho não organizou-se à altura do que este episódio da história da educação e da humanidade exigia: se alguém tivesse ido dormir em 2019 e acordasse em 2022 para ir à escola, perceberia como diferença apenas o uso da máscara. Os currículos, os horários, as ementas e tudo o mais permaneceram tal e qual. Algumas tentativas de resposta estão sendo feitas à medida que os problemas aparecem, mas certamente se poderia ter pensado alternativas que fossem excepcionais em nível próximo aos problemas que a pandemia gerou.
